Fatal Fury: City of the Wolves ressuscita a série depois de quase 30 anos, continuando a história e entregando algumas das melhores lutas que a desenvolvedora SNK já produziu.
Não vou mentir: Terry Bogard é o meu personagem preferido entre todos da cultura pop. Não sei da onde surgiu essa admiração, provavelmente por causa da exibição dos OVA’s de Fatal Fury, feitos no traço de Masami Obari, no programa U.S Mangá, na extinta TV Manchete. O jeito rebelde, o estilo, os golpes, tudo nele parecia muito legal. Fui atrás de conhecer mais de sua história, joguei Fatal Fury 1 e 2 no meu Mega Drive e sempre escolhia ele no meu time em The King of Fighters (Terry, Leona e Kim, meu time!).
Agora, essa admiração não se convertia em habilidade de jogo. Eu nunca fui bom em nenhum jogo de luta e sempre preferi jogar singleplayer (eu prefiro o singleplayer em qualquer coisa) do que lutar contra, fosse no arcade (eu sabia que ia perder minha ficha) ou no online (entrei poucas vezes pra jogar online Mortal Kombat ou Street Fighter). Gostava de ver a história dos trios e do jogo e não me importava em “ser o melhor.”
Mas, infelizmente, Fatal Fury não era popular o suficiente para ter uma máquina própria no arcade perto de casa. Só tinha uma de King of Fighters’97 (que foi atualizada até a ‘99) e Street Fighter Alpha/Zero. Fatal Fury se tornou só aquele pano de fundo para a história do trio Terry, Andy e Joe. Quem era o garotinho que aparecia junto com Terry na pose de vitória e porque ele usava aquela jaqueta marrom e cabelo curto eu só fui descobrir muito mais tarde quando vi uma máquina de Gahou: Mark of the Wolves. Não pude jogar tanto quanto queria, mas agora, eu tenho essa chance.
Por que, quase 30 anos depois, voltamos South Town em Fatal Fury: City of the Wolves (site oficial). Vamos falar sobre o novo jogo da franquia Fatal Fury e, se você ficar com dúvidas, deixe um comentário.
Fatal Fury: City of the Wolves
Bem-Vindo a Cidade dos Lobos
Depois de quase três décadas sem um novo título principal, a franquia Fatal Fury finalmente está de volta com City of the Wolves. E não volta apenas como mais um jogo de luta tentando pegar carona no sucesso de Street Fighter ou Tekken. Ele chega com uma identidade forte, uma jogabilidade envolvente e, principalmente, com a clara intenção de recuperar o brilho da série que a SNK quase deixou para trás. Só que, junto com esse retorno promissor, também vêm decisões criativas bem esquisitas — e algumas delas, honestamente, desconfortáveis de analisar.
City of the Wolves começa sua história alguns anos depois dos eventos de Garou: Mark of the Wolves, de 1999, mas se apega muito ao que aconteceu no primeiro jogo. Há uma menção muito sutil aos Pergaminhos Sagrados do terceiro jogo e o segundo é quase que uma lembrança. Como se a SNK quisesse pegar os fãs pela nostalgia daquele tempo em que você jogava Fatal Fury 1.

Como sequência direta, o foco ainda é em Rock Howard, o jovem lutador que carrega a herança pesada de ser filho do vilão Geese Howard e protegido de Terry Bogard, um dos ícones da série. A história gira em torno da busca de Rock por entender suas origens, enquanto ele se envolve com personagens clássicos e novos, enfrentando os perigos de uma South Town que continua tão corrupta, violenta e cheia de lendas vivas quanto sempre foi.
A narrativa em si não é revolucionária, mas cumpre bem seu papel dentro do estilo do jogo. Ela é contada por meio de cutscenes com estética de quadrinhos americanos, que usam cores fortes, contornos marcantes e sombreado pesado. O visual é claramente inspirado por HQs, mas sem exagerar como em Comix Zone ou no filme Hulk de 2003. A sensação que fica é de algo estilizado, mas ainda funcional, sempre mantendo a clareza visual nas lutas. Se nos trailers essa direção de arte pode ter parecido simples demais, na prática ela impressiona — principalmente quando vista em uma boa tela. É um estilo que funciona melhor do que os modelos meio realistas que a Capcom vem usando em Street Fighter 6, por exemplo. Além disso, o visual casa bem com o que a SNK sempre fez de melhor: personagens marcantes, carismáticos e muito expressivos em combate.
A Lista de Personagens é um Ponto Importante
E são justamente os personagens que geram a maior dualidade de City of the Wolves. A lista de lutadores mistura rostos já conhecidos dos fãs com novidades bem-vindas — e outras que são, no mínimo, estranhas. Entre os veteranos estão Rock, Terry, B. Jenet, Gato, Hokutomaru, Hotaru Futaba, Kain R. Heinlein, Kevin Rian, Kim Dong Hwan, Marco Rodriguez e Tizoc. Também voltam nomes clássicos da série Fatal Fury, como Billy Kane e Mai Shiranui, acompanhados de novas figuras como Preecha, uma aprendiz de Joe Higashi, e Vox Reaper.

Até aí, tudo bem — temos zoners, grapplers, personagens rápidos, fortes, técnicos e excêntricos, cobrindo uma boa variedade de estilos. Mas o que ninguém esperava é que, no meio disso tudo, estariam Cristiano Ronaldo e Salvatore Ganacci — sim, os dois de verdade, como eles mesmos, e não como versões fictícias ou inspiradas.
Ganacci, DJ e produtor musical, aparece com um conjunto de golpes exagerado e cômico que mistura música, dança e uma energia quase cartunesca. Então fica a dúvida: Se vai ter um personagem assim, não era melhor trazer de volta o Duck King?
Já Cristiano Ronaldo usa a bola como arma principal em seus combos, com movimentos ágeis e um estilo que até diverte quando se aceita o absurdo da ideia. O problema é que essa escolha não parece ter vindo de uma ideia criativa, mas de uma exigência externa.
Conduto, existe uma explicação: desde 2022, a SNK é quase inteiramente controlada pelo Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita, e tanto Ronaldo quanto Ganacci têm vínculos diretos com o governo saudita. Ronaldo joga pelo Al-Nassr, clube também ligado ao fundo, e Ganacci tem laços públicos com a família real saudita. Colocar esses dois nomes dentro do jogo como personagens jogáveis — e não como participações especiais ou easter eggs — soa como uma decisão de marketing forçado que rompe completamente a imersão do universo do jogo.

O desconforto aumenta quando se percebe que essas participações foram mantidas em segredo até bem perto do lançamento, provavelmente para evitar reações negativas antecipadas. Ronaldo não aparece na história principal ou nas cutscenes, e ainda assim está integrado ao jogo em termos de jogabilidade e customização. Parece algo jogado às pressas, como se o conteúdo tivesse sido inserido depois que o jogo já estava praticamente pronto, por motivos que pouco têm a ver com design de jogo.
E embora a presença de Ganacci funcione como um alívio cômico — e seja possível ver alguma lógica na sua inclusão —, a de Ronaldo levanta questões que vão além do entretenimento, tocando diretamente em como o financiamento externo pode afetar a liberdade criativa de um projeto. É como ver um projeto promissor carregando um peso que ele não escolheu carregar.
Jogabilidade bem Feita
City of the Wolves é um dos jogos de luta mais bem pensados dos últimos tempos. O sistema de combate é dinâmico, profundo e permite uma liberdade rara. Tudo gira em torno do sistema REV, um medidor que alimenta golpes especiais chamados de Rev Arts, Rev Blows e Rev Accels.
A diferença aqui é que você pode usar esses golpes com frequência, sem consumir a barra de uma vez — mas se exagerar, entra no estado de superaquecimento, que te deixa vulnerável e sem acesso a esses movimentos até se recuperar. Isso cria um ritmo de combate de empurra-e-puxa, onde é preciso pensar bem no timing de cada ação. O jogador tem liberdade para explorar combinações criativas, experimentar sequências novas e até improvisar, algo que falta em muitos jogos modernos em que os combos já parecem pré-definidos.

Complementando o REV, temos o sistema SPG (Selective Potential Gear), que substitui o antigo T.O.P. System de Mark of the Wolves. Ele permite escolher em que ponto da barra de vida o personagem receberá bônus de dano e poderá usar golpes com armadura — um detalhe que adiciona mais uma camada de estratégia.
Além disso, elementos como Feints, Braking, e Wild Punish aumentam a profundidade do combate e dão espaço para jogadores mais avançados brilharem, sem tirar o espaço dos iniciantes. Para quem está começando, existe o Smart Style, um esquema de controle simplificado que facilita a execução de combos, ainda que com menos recursos disponíveis.
Pacote Básico
Mesmo com todos esses méritos, é impossível ignorar que City of the Wolves é um jogo com recursos mais limitados do que seus concorrentes diretos. A comparação com Street Fighter 6 é inevitável: enquanto o título da Capcom vem cheio de conteúdo extra, modos paralelos, campanhas, customizações e apelo mainstream, o novo Fatal Fury aposta em profundidade e personalidade, mas sem todo esse brilho. Os menus são simples, há pouco conteúdo fora do combate, e até as cutscenes parecem feitas com um orçamento contido. Ainda assim, quando o jogo começa, tudo isso se dissolve, e o que fica é um sistema de luta afinado e gostoso de explorar.

O modo história, por exemplo, é cheio de detalhes curiosos e quase desnecessários sobre os cenários e locais de South Town, que aparecem só “por diversão”. A sensação é que quem criou esse modo realmente gosta daquele universo e quis brincar com ele, sem se preocupar com a lógica comercial de entregar algo grandioso. No online, o netcode de rollback (reversível) garante partidas estáveis, o que é essencial num gênero que exige precisão de quadro a quadro. Tudo isso reforça que o coração do jogo está no combate e na paixão pelos personagens e pelo legado da série.
E talvez seja justamente por isso que a inclusão de figuras externas, com motivações corporativas tão transparentes, pese tanto. O jogo poderia ser um símbolo do renascimento criativo da SNK, uma celebração de sua história e de sua capacidade de competir num mercado que já deixou a empresa para trás muitas vezes.
Mas a presença desses elementos externos desvia o foco, e transforma o jogo em uma ferramenta de marketing geopolítico — ainda que indiretamente. Jogos de luta sempre foram palco de crossovers malucos, isso não é novo. Mas há uma diferença entre ver Terry Bogard lutando contra Ryu e ver Cristiano Ronaldo chutando uma bola mágica em South Town. Uma coisa nasce do amor pela cultura de jogos, a outra soa como imposição.
Veredito sobre Fatal Fury: City of the Wolves
No fim das contas, Fatal Fury: City of the Wolves é, sim, um bom jogo. Um ótimo jogo, na verdade, para quem busca profundidade, liberdade criativa no combate e uma estética estilizada com personalidade. Mas é também um jogo que mostra como as decisões corporativas podem afetar a integridade de um projeto artístico, e como é difícil separar as coisas hoje em dia.
Ele acerta em cheio quando o assunto é gameplay e fidelidade ao espírito da SNK. Mas tropeça — e feio — ao permitir que interesses externos manchem o que deveria ser uma celebração do retorno de uma das franquias mais importantes dos jogos de luta. O potencial está ali, brilhando. Só que ele vem com um asterisco incômodo que ninguém consegue ignorar.
Fatal Fury: City of the Wolves

Prós e Contras
Prós
+ Sistemas de combate ofensivos e defensivos robustos;
+ O rollback netcode permite o jogo sem lag;
+ Gráficos detalhados inspirados em quadrinhos;
+ Crossplay entre PC, PlayStation e Xbox;
+ Música fantástica;
Contras
– Inclusão forçada de lutadores;
– Longos códigos de amigos;
– Lag de tela inicial ocasional;
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